Ao melhor estilo pragmático de um oficial que chega ao generalato, o vice-presidente do Brasil, Hamilton Mourão, cumpriu agenda em Macapá durante a semana, para dialogar com autoridades locais sobre a nova composição do Conselho da Amazônia, colegiado consultivo da Presidência da República, que passa a ter sua coordenação. Foi uma manhã considerada produtiva e esclarecedora a respeito de se dirimir questionamentos sobre a reconfiguração do conselho sem necessariamente alocar assentos para os governadores da região, que passam a ser ouvidos em diálogos como o que ele estabeleceu em Macapá. Antes de decolar, ainda no aeroporto da capital do Amapá, Mourão conversou com os jornalistas, cujos principais temas e questionamentos o blog CleberBarbosa.Net traz de forma resumida.
Cleber Barbosa, da Redação
Quando surgiu a ideia de recompor o Conselho da Amazônia no âmbito da Presidência da República?
Hamilton Mourão – Foi no início do ano, numa reunião do Conselho do Governo, quando o ministro do Meio Ambiente levantou as peculiaridades e as características da região amazônica, não só à luz da questão ambiental, mas também de proteção e desenvolvimento. O presidente da república naquela ocasião julgou por bem recompor o Conselho da Amazônia, uma vez que tinha sido criado em 1995, no governo do presidente Fernando Henrique, mas que nunca se reuniu, não tem uma ata, não tem nada, ficou só no papel.
E qual o papel do Conselho da Amazônia?
Mourão – Tem a finalidade de coordenar, controlar e integrar as politicas públicas de diferentes ministérios que atuam aqui na região, mas não se falam e há muita superposição de esforços o que leva a muito desperdício de recursos, uma falta de coordenação e controle, obviamente, nos mais diversos assuntos. Naquele momento eu então me apresentei ao presidente como voluntário a assumir essa coordenação, que prontamente acatou. A nossa visão é de que o Conselho tem que atuar em três ações gerais, que são a ação de proteção, a ação de preservação e a ação de desenvolvimento sustentável da região amazônica.
Quais as primeiras providências a serem tomadas?
Mourão – Estou ouvindo cada um dos ministérios, para que apresentem as políticas e as suas atividades, de modo que eu possa estabelecer critérios de coordenação e controle. Ao mesmo tempo estou indo aos diferentes estados, já estive em Roraima, no Amazonas, no Pará, agora aqui no Amapá e daqui estou indo ao Maranhão. Na semana que vem vou a Mato Grosso, Rondônia e Acre, finalizando depois no Tocantins. De posse desses dados todos terminaremos um planejamento de integração de esforços estabelecendo metas e objetivos, priorizando quais são as ações, não tenho dúvidas que a prioridades vem a ser o combate ao desmatamento ilegal num primeiro momento. E esse combate não é meramente uma ação repressiva, tem a questão do ordenamento territorial, tem a questão da Funai, tem a questão de áreas sob o patrimônio da União, então tem vários organismos envolvidos nisso.
Estratégias práticas para enfrentar o problema fundiário.
Mourão – No próximo dia 25 de março vamos fazer a primeira reunião já para apresentar esse planejamento, e posteriormente vou reunir os governadores para também apresentar a eles e ouvir também suas críticas, para que o planejamento seja realmente ratificado ou para que a gente tenha que mudar alguma coisa.
As manifestações nas ruas de Macapá por representantes do setor produtivo que criticam a falta de sintonia entre os órgãos estaduais e federais do setor de licenciamentos.
Mourão – Esse assunto nós também discutimos e ouvimos a opinião do governador Waldez de que o problema é muito claro, o pessoal não tem titulação de terras, pois não houve uma transferência [de terras] até o presente momento. Tem uma Medida Provisória que foi assinada pelo presidente do Congresso, senador Davi Alcolumbre, em outubro do ano passado, para essa questão da transferência das terras, tanto para o estado do Amapá como para o estado de Roraima, dois estados que ainda não tem a sua titulação. Tem a questão do georreferenciamento, para que ICMBio, Funai, Secretaria de Patrimônio da União, enfim todo mundo fale a mesma linguagem. Mas entendo que esse é um assunto que eu já anotei, necessita de urgência e obviamente nós vamos precisar sentar com todo esse pessoal ver qual é a dificuldade que está colocada. Já sabemos que muitos desses organismos também não tem suas áreas georreferenciadas, por isso esses problemas acontecem como esses produtores rurais daqui estão apresentando as suas demandas.
Alguém para assumir a coordenação da questão fundiária do Amapá.
Mourão – Eu julgo que nós vamos ter que ter uma instituição capacitada que faça esse trabalho para todo mundo, já que essas diferentes autarquias ponderam que não tem recursos, que não tem veículo, que não tem diária, não tem gente, enfim, acho que a coisa vai acabar caindo nas costas das Forças Armadas, que tem a capacidade operacional de executar isso aí.
Como crescer sem desmatar, visto que o agronegócio vinha crescendo no Amapá, mas agora vive uma crise pela falta de simples licenças ambientais em uma atividade de baixo impacto?
Mourão – Dentro da própria Medida Provisória 901 que está sendo discutida no Congresso [Nacional] está se avaliando o caso particular do Amapá e Roraima, que tem mais de sessenta por cento de seu território como áreas protegidas, ou seja, terra indígena ou área de proteção ambiental. Os dois estados são bem similares e aí haveria a busca de uma flexibilidade em relação àquela questão dos oitenta por cento em relação às demais áreas que estão abertas à exploração. Mas o que tem que ficar claro é que o produtor rural nessa região necessita de um amparo em termos de assistência técnica porque infelizmente a maioria dos nossos produtores usa uma tecnologia que já foi ultrapassada. Não vou ousar dizer que o pessoal está no século 19, pois estaria sendo leviano, mas temos que trazê-los para o século 21, de modo que sejam capazes de produzir mais com menos, até porque a gente sabe que o meio ambiente é um tema do século 21 e os compradores dos nossos produtos, dos nossos alimentos, enfim, querem ter certeza de que estão comprando algo produzido de forma legal, com selo verde, então vejo a questão dessa forma, passando pela questão anterior, do ordenamento territorial, a titulação da terra e a assistência técnica por meio da Embrapa, do Instituto de Terra daqui, do licenciamento corretamente concedida, para que o nosso produtor tenha realmente produtividade.
Como aumentar a produtividade nos empreendimentos rurais da Amazônia?
Mourão – Estive no Pará e o governador colocou que lá em um hectare o camarada cria menos de uma cabeça de gado, enquanto que em outras regiões do Brasil isso varia de sete a dez, de sete a nove [cabeças de gado], então se nós chegarmos aqui a ter quatro, cinco cabeças de gado por hectares, nós não vamos desmatar mais nada e vamos produzir mais, só que para isso precisa de tecnologia.
As participação da sociedade civil após a saída dos governadores no Conselho da Amazônia?
Mourão – É bom especificar mais uma vez que está criado para integrar as políticas públicas a nível de governo federal, mas além disso, ouvir os estados de modo que haja aqueles pontos de interseção onde o governo federal e os estados irão atuar em conjunto, independente do governador estar sentado ou não [no Conselho] pois ele está sendo ouvido, está sempre colocando as suas demandas. Já existe um planejamento feito pelo consórcio dos governadores da Amazônia Legal, com eixos comuns a todos os estados, as entidades da sociedade civil, como federação do comércio, federação de indústria, também estão me procurando, estão apresentando suas demandas, bem como outras entidades que não sejam necessariamente representativas de segmentos específicos, mas representam determinadas regiões aqui dentro da Amazônia e estão apresentando suas ideias, então ninguém está ficando de fora desse planejamento e que fique claro que dentro dessas vertentes que falei, de proteção, preservação e desenvolvimento sustentável, nós temos que buscar aquelas prioritárias de modo que efetivamente elas funcionem. A gente tem que fazer a roda girar e não pura e simplesmente ficar no discurso. E eu não quero ficar só no discurso, quero que as coisas se resolvam.
Perfil
Entrevistado. Antonio Hamilton Martins Mourão tem 66 anos, é de Porto Alegre (RS) e ingressou no Exército em 1972, na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman) e em 1975 foi designado aspirante-a-oficial da arma de artilharia. Dentre os principais comandos, foi instrutor da Aman, cumpriu Missão de Paz em Angola, foi adido militar na embaixada do Brasil na Venezuela e comandou o 27° Grupo de Artilharia de Campanha em Ijuí (RS) e a 2ª Brigada de Infantaria de Selva em São Gabriel da Cachoeira (AM ) e a 6ª Divisão de Exército em Porto Alegre (RS). Em 2018 foi eleito vice de Jair Bolsonaro.
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