Cleber Barbosa, da Redação
Ele foi “mineiro” – trabalhava na mina – e ela professora na pequena cidade de Serra do Navio, a cerca de 200 quilômetros de Macapá, em plena floresta amazônica. Antônio Claudio e Selma Maria, hoje com 73 e 68 anos respectivamente, viraram como se fosse guias de turismo na bucólica comunidade serrana, tanto que decidiram unir o útil ao agradável e organizaram um pequeno “Museu do Manganês”, no pátio da casa deles. E já começam a receber visitantes.
A ideia vinha sendo amadurecida nos últimos anos, pois eles costumam mesmo receber visitantes, principalmente ex moradores de Serra do Navio, que trabalharam na mineradora Icomi (Indústria e Comércio de Minérios) S.A. nos áureos tempos do manganês. “Mas também vêm muitos estudantes universitários, pesquisadores, jornalistas e também turistas realmente que ouviram falar da história da nossa cidade e decidem vir aqui para confirmar, então as pessoas normalmente nos indicam, afinal dos antigos moradores ficaram poucos”, conta dona Selma.
Seu marido Antônio, conhecido por lá como “Padeiro” [foi sua primeira profissão na Icomi] é até mais “explorado” pelos visitantes, pois devido conhecer as antigas minas como a palma de sua mão, sempre é convidado a conduzir os turistas de carro – de preferência com tração nas quatro – até lugares famosos, como a montanha “Torre”, o “Bota Fora”, além de antigas minas identificadas pelas siglas “T-20”, a “F-12” e, claro, a famosa “Lagoa Azul” no fundo de uma mina.
Acervo
Foi então que este ano, durante os preparativos para mais uma edição do “Encontro dos Serranos”, evento que incentiva antigos trabalhadores e estudantes da Serra do Navio retornarem à cidade, que eles decidiram inaugurar o mini museu. A programação deste ano do encontro foi aberta com um baile em Macapá, na sexta-feira (7), um Luau em Serra do Navio no sábado (8) e um almoço no balneário Pedra Preta no domingo (9).
Logo na estréia, muita nostalgia e emoção por parte dos visitantes, ante o conjunto de objetos, utensílios, equipamentos de segurança, uniformes e muitos documentos dos tempos da vida boa que os funcionários da mineradora gozavam em Serra do Navio. “A gente decidiu compartilhar como era organizada a empresa, desde os retornos ao médico, passes de trem, crachás, cautela dos móveis que recebemos quando ganhamos nossa casa, até os certificados escolares, pois até nisso a Icomi foi pioneira, com um projeto de educação de adultos”, diz Selma.
Projeto incentiva ex moradores a doar mais objetos ao museu
Falando a CleberBarbosa.Net, por telefone, o casal idealizador do Museu da Icomi diz estar aberto a sugestões e também doações de todo e qualquer objeto que possa enriquecer o acervo familiar que eles possuem no espaço. “A gente sabe de pessoas que guardam coisas muito raras, como a coleção da revista Icomi Notícias, que foi editada por muitos anos e que é um registro riquíssimo daqueles tempos maravilhosos”, diz dona Selma.
Ela e o marido conseguiram valorizar ainda mais alguns objetos, que viraram peças de decoração, como alguns velhos capacetes de segurança – que tinham cores diferenciadas de acordo com o setor de trabalho. “Mas a gente guarda ainda intocados os móveis originais, da mobília que foi toda desenhada pela arquiteto que projetou a vila de Serra do Navio, o dr. Oswaldo Bratke”, diz ela, que atualmente é serventuária do Fórum local.
Testemunho
Mas os objetos e documentos criteriosamente organizados no pequeno museu não seriam nada sem a atuação dos guias – ou curadores da exposição. Dona Selma e seu Antônio são exímios contadores de histórias, nada de folclore ou exageros, mas muito realistas quando o assunto é falar da empresa onde ele entrou como braçal e fez carreira por quase 30 anos. Seu Padeiro conseguiu um exemplar do famoso ‘bandeijão’ do restaurante dos operários, uma peça em inox que suscita muitas histórias pitorescas, assim como cada item devidamente catalogado, identificado e protegido por capas plásticas ou tecido.
O Museu da Icomi em Serra do Navio fica na Rua DD-3, nº 86, Vila Administrativa – CEP 68.948-000. O telefone é (96) 3321-1133 e o email de contato deles é [email protected]. É preciso agendar a visita. Eles tirarão recesso de 20/12 a 10/01/2019.
Em mensagem, turistas agradecem a acolhida na residência do casal
“Querida Selma e Padeiro, imagine então a nossa alegria de ser recebido tão bem num domingo de sol, tomar café com cuscuz e ainda laranjas, falar de tantas histórias e de amigos serranos.Voltamos, literalmente, ao passado quando nos deparando com àquele Museu criança que começa a engatinhar. Mas ele já existe, com tantos documentos, fotos e objetos antigos que estiveram em nossas casas, com os nossos pais, na escola, no hospital, na EFA… Enfim, são raridades em que estivemos inseridos no dia-a-dia da nossa saudosa Serra do Navio. Parabenizamos vocês por essa brilhante iniciativa, pela dedicação em manter viva a nossa memória serrana. Esse momento da visita ao Museu foi muito especial para nós, nos sentimos novamente naquela Serra dos nossos melhores sonhos. Tenho certeza que o Museu será muito visitado à partir de agora. Por fim, pedimos a todos os serranos que tiverem objetos, fotos, documentos ou quaisquer utensílios que disponham ao Museu da Icomi da professora Selma&Padeiro.Valeu amigos e muito obrigado por tudo”.
* Sr. Adenilson Paranhos e família. Engenheiro aposentado, radicado em Belém.
Curiosidades
– A Vila com pouco mais de 3,7 mil habitantes foi projetada pelo arquiteto brasileiro Oswaldo Bratke com o objetivo de abrigar os trabalhadores da Indústria e Comércio de Minério (Icomi).
– Projeto recebeu várias premiações. Concebida para ser uma cidade completa e auto-suficiente, era uma verdadeira ilha no meio da floresta.
– A Vila Serra do Navio não possuía cercas ou muros, parecia um grande quintal compartilhado por todos os moradores.
1956
Ano em que o arquiteto Oswaldo Bratke projetou a Vila de Serra do Navio, inaugurada em 1961.
Mobília
Leia também:
- Serranos tão apaixonados que já são tratados como “Serráqueos”
- Especialista coloca Serra do Navio entre os “clássicos da arquitetura”
Compartilhe:
Deixe Seu Comentário abaixo: