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Juiz federal João Bosco Costa Soares da Silva, nos estúdios da rádio Diário FM | Foto: Joelson Palheta
Entrevista

“Magistrado tem que visar resultados e não apenas gerar estatísticas”

Um dos magistrados mais atuantes no Amapá – combatido também – mas sem dúvida dono de um rendimento inquestionável para conciliar em busca de resultados, o juiz federal João Bosco Costa Soares da Silva acaba de colocar frente a frente todos os atores envolvidos no problema da demora para a pavimentação das rodovias federais que cortam o Amapá. Em audiências em Macapá e Laranjal do Jari, ele definiu as condicionantes e os prazos para que poder público, iniciativa privada e órgãos licenciadores possam destravar obras como a BR 156, há 70 anos em construção no país.

Betral

Cleber Barbosa, para a Revista Diário

O seu gabinete existe fisicamente, claro, mas o senhor acaba imprimindo um ritmo bem diligente à sua atuação como magistrado, inclusive agora que passou a responder pela Comarca de Laranjal do Jari, não é?
João Bosco Soares – Sim, e vim do Jari recentemente com boas notícias, como o asfaltamento da BR 156, que é uma luta antiga, iniciada ainda na década de 1930 com o Marechal Rondon que idealizou essa rodovia, até hoje inconclusa. Sobre a Comarca, o que aconteceu na verdade foi que a colega de lá pediu remoção, o CNJ exarou uma decisão proibindo remoção e promoção para o Jari e para Oiapoque, além da 4ª Vara Criminal aqui de Macapá, de maneira que o Tribunal me designou para responder pelo Jari, é nesse contexto que eu estou lá. Então estando respondendo por lá, de dois em dois meses eu vou lá, fazer audiências, para também não deixar a Sub Seção abandonada.

E uma dessas audiências foi sobre a pavimentação da BR 156?
João Bosco – Exatamente, foi uma audiência pública, de conciliação, mas sobre essa demanda a gente já vem trabalhando há dois anos. Havia um problema seríssimo ali com relação a licença ambiental, pois o ICMBio fazia exigências desproporcionais para que o Ibama pudesse emitir a licença ambiental. Nós então chamamos os órgãos, DNIT, ICMBio, Ibama, enfim e colocamos racionalidade, ou seja, que o ICMBio possa fazer exigências para a construção da rodovia, tudo bem, mas não exigir coisas que o outro não possa dar, que o DNIT não possa atender. Chamamos o Iphan também para resolver o problema arqueológico, ninguém mais do que eu é apaixonado por questões da arqueologia, pois sem esses vestígios do passado, que a gente possa colher e estudar, a gente nunca vai compreender a nossa trajetória. Então é fundamental que qualquer obra pública respeite esse trabalho arqueológico, não podemos atropelar isso, agora também em nome disso nós não podemos ficar inviabilizando obra pública.

Daí a audiência ser chamada de conciliação, não é?
João Bosco – Sim, nós conseguimos chamar todos os atores envolvidos, desde 2016 diga-se de passagem, então o trabalho arqueológico foi todo feito, pelo menos na área de domínio ali da rodovia, infelizmente alguns sítios arqueológicos já foram destruídos pelo próprio traçado da estrada, mas o que deu para resgatar foi resgatado. E tem material para ser resgatado, no Lote 1, chegando a Laranjal do Jari. Hoje eu diria que temos a licença ambiental, hoje a rodovia pode ser pavimentada sem problema algum. Para aqueles que não sabem, o Lote 4, que vai aqui do quilômetro 21 até o Rio Vila Nova, são 60 quilômetros, quando iniciamos o processo judicial que o município de Laranjal do Jari provocou, foi o município que provocou o Judiciário Federal, então nesse lote já tinha uma empresa contratada, com ordem de serviço do Estado do Amapá, há um ano, e não podia executar a obra por falta de licença ambiental. E com R$ 35 milhões de reais na conta do convênio, foi nesse contexto que nós assumimos essa questão. Hoje, no próximo verão, que é agora em julho, essa obra vai começar.

Algumas pessoas fazem confusão sobre a divisão dos lotes, mas é porque a estrada começa no Jari e vai ao Oiapoque, por isso o primeiro lote é o 4?
João Bosco – É verdade, daí os lotes são separados de 1, 2 3 e 4 de lá para cá. Só que nós vamos começar a obra no sentido decrescente, nós construímos tudo isso em audiência, o Estado do Amapá conosco, o DNIT conosco, o dr. Vilarinho, o Ibama conosco, vamos fazer justiça, o ICMBio conosco, acredite, sensível, e eu disse ao ICMBio que na hora de fazer o projeto executivo os lotes 1 e 2, que foi eles mais atuaram, quero vocês discutindo com a empresa, quero que vocês participem do projeto executivo.

Ou seja, a ideia é discutir o problema na fonte?
João Bosco – Sim, disse isso, quero que o que eles trataram com o DNIT seja cumprido, honrado, então nós temos hoje o ICMBio conosco, isso é importantíssimo.

Falou-se também sobre a possibilidade de um desses lotes ficar sob a responsabilidade do Exército, através do Batalhão de Engenharia e Construção. Existe esse possibilidade?
João Bosco – Olha, a gente já analisou, não é viável, vamos deixar com o DNIT porque é mais rápido. O Exército tem uma logística muito demorada, então já há um consenso entre nós, isso tudo definido em audiências públicas, pois delegar isso para o Exército iria demorar mais, então uma rodovia que já esperou 70 anos de ficar esperando ainda mais, nós temos que executar mais rápido agora. Quero ratificar que hoje nós construímos uma solução para os quatro lotes do trecho sul.

E o trecho norte doutor, que vai de Calçoene a Oiapoque?
João Bosco – Bem, esse trecho está mais fácil de resolver, segue muito mais rápido agora que o próprio ministro dos transportes veio aqui e anunciou o início da obra no lote 2 lá no Oiapoque, inclusive com recursos disponíveis, com previsão de chagar até a Vila do Carnot até o final desse ano.

Na vinda do ministro Valter Casemiro aqui também aconteceu o anúncio da obra do novo aeroporto de Macapá, outra obra há muito tempo aguardada não é?
João Bosco – Sim, a ideia é entregar em dezembro e pelo planejamento deles isso é bem provável que isso aconteça mesmo, um novo aeroporto para Macapá e para o Amapá. Eu estive na solenidade presidida pelo ministro dos transportes, e o melhor desses eventos é que se anunciam coisas concretas, eu gosto muito de resultados, sabe? Eu como magistrado sempre fui muito preocupado com isso, os juízes não tem que se preocupar só com estatísticas, uma liminar a mais, nós temos que nos preocupar em efetivar direitos, concretizar.

Daí seu empenho nessa questão de iniciar a pavimentação dessa rodovia federal, não é?
João Bosco – Sim, hoje os quatro lotes estão encaminhados. O lote 4, com a execução da obra ainda esse ano, vamos começar os serviços em julho com o Consórcio BR 156, temos prazo inclusive para montar o canteiro de obra, a chamada mobilização da obra, então se ela não cumprir vai estar fora da obra, inclusive com previsão de multa, multa alta. Com relação ao lote 3, ajustado com o DNIT em audiência, que vai do Rio Vila Nova até o Macará, que corresponde a 50% do total do trecho entre Macapá e Laranjal do Jari que falta pavimentar, já vai ser licitado, até 24 de outubro deste ano já tem que estar licitado. E eu só não fixei multa porque vieram dois diretores com poder decisório do DNIT de Brasília para nossa audiência no Jari, para ver a importância que o Ministério dos Transportes está dando para o Amapá, acho importante a gente registrar isso. Eles garantiram que até essa data o edital de licitação do lote 3 estará lançado, o que significa que no ano que vem nós teremos obras no lote 4, que já começa esse ano, e obra no lote 3.

E os demais lotes doutor João?
João Bosco – Os lotes 1 e 2 nós ajustamos o seguinte, que até 24 de abril do ano que vem vai lançar o edital de licitação para contratar o processo executivo dos dois lotes, que perfaz os 100% do trecho que falta construir entre a capital e o sul do estado. Lançando esse edital eu calculo que em mais um ano, ou seja, 2020, a gente vai ter o projeto executivo concluído e poderemos lançar o edital de licitação das obras. Em média um lote desse demora de três a quatro anos, então fazendo uma futurologia podemos prever que até 2024 ou 2025 todo o trecho de Macapá ao Jari estará pavimentado, assim como hoje nós podemos prever que todo o trecho Macapá-Oiapoque estará totalmente pavimentado em 2020. Do ponto de vista do Judiciário esse questão da BR 156 está resolvida, aí nós já devemos pensar em outras localidades aqui do estado, como Pedra Branca do Amapari e Serra do Navio, a partir de Porto Grande, que não tem nem projeto executivo, por uma falta de movimentação das autoridades daquela região.

É muito interessante ver seu pragmatismo ao falar desses conflitos que chegam até a Justiça, antes do magistrado é uma inquietação do cidadão João Bosco, afinal o senhor já mora aqui a quanto tempo?
João Bosco – Ah, já são muitos anos, eu cheguei aqui em 1998 como juiz substituto, fiquei até 2001, depois fui para Goiânia, fiquei de 2002 a 2005, então como eu já tinha tido uma experiência feliz no Amapá e abriram promoções em toda a Amazônia decidir ficar aqui, acho que tinha um destino no Amapá. Voltei em 2005 para ficar dois anos e fiquei até agora, eu acho que não há dada que prenda mais o ser humano do que duas coisas: poder realizar e poder construir uma história e o Amapá me deu essas duas condições.

O senhor também criticou a atuação política de algumas instituições, por que?
João Bosco – A Função da Justiça Federal é harmonizar, não permitir que interesses menores adentrem na porta da justiça; vários órgãos federais e estaduais e até o MP estadual são indicações políticas; todos esses órgãos são permeados por interesses políticos partidários e via de conseqüência, se quiserem travar uma obra que inviabilize um governador que é de uma facção política diferente esse órgão vai inviabilizar, atendendo interesses políticos partidários.

O senhor também atuou decisivamente para o fim dos bloqueios de estradas aqui no Amapá durante a greve dos caminhoneiros não é?
João Bosco – O governo federal não deveria ter se agachado porque a conta quem vai pagar é a própria sociedade. O presidente não deveria ter se ajoelho a esse movimento, e só ajoelhou porque é um governo fraco; se fosse um governo que tivesse mais legitimidade certamente teria enfrentado à altura esse movimento, com a força que havia necessidade de ser usada. É preciso termos um presidente com legitimidade e autoridade para harmonizar o país, que vive momento de muita conflagração, muita intolerância. As pessoas já não aceitam mais ouvir a opinião dos outros; há um grau de hostilidade muito grande. Precisamos de um presidente que consiga dialogar com empresários e trabalhadores e reprimir os bandidos, porque entre os empresários há bandidos como vimos nesse locaute, que é a greve dos empregadores do ramo de combustíveis; precisamos de um estado que tenha algum rumo, de direção, não como esse, sem o mínimo de ordem, proporção que um pequeno grupo consegue colocar a faca no pescoço do governo para tirar vantagem, mostrando que tem algo muito errado neste país.

Por aqui as invasões…
João Bosco – Macapá é uma cidade muito jovem e nós estamos corrigindo os erros agora, é o momento, porque se deixarmos passar será muito tarde. Em uma inspeção que fiz no Canal do Jandiá me deparei com postes da CEA e encanação da Caesa, mostrando que há incentivo para que pessoas morem no esgoto pra tirar proveito eleitoreiro, comprando votos pra mantê-las no esgoto. Isso é inaceitável! Eu não sei qual o governo que colocou, mas estão lá. Há uma política oficial de incentivo para que as pessoas morem no esgoto. Imagina só um Estado que incentiva pessoas morarem em esgoto pra depois tirarem proveito eleitoreiro, comprarem votos dessas pessoas. Francamente! Isso não é um modelo civilizatório.

 

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