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O governador do Amapá, Clécio Luís, disse em conversa com a CNN em Macapá que a exploração de petróleo na margem equatorial é uma oportunidade para que o estado possa melhorar seus indicadores econômicos e sociais. Ele também refuta a ideia de que o empreendimento possa ter o mesmo destino de projetos passados que acabaram não trazendo desenvolvimento ao estado.
Edição: Cleber Barbosa (CB) | Reportagem Caio Junqueira (CNN)
Governador, o senhor tem feito a defesa da exploração do petróleo na Margem Equatorial. Por quê?
Porque é uma matriz energética e econômica fundamental para o país, e nós vivemos… eu vou tentar sintetizar aqui ao máximo a seguinte situação. A gente vive em um estado que tem os melhores indicadores ambientais do país e talvez do mundo. No entanto, nós temos os piores indicadores sociais e econômicos do país. Em quase todos os indicadores sociais e econômicos, o Amapá é o 27°. No entanto, a gente vai para os indicadores ambientais, são os melhores. Espera aí, isso está errado, nós queremos manter esses indicadores ambientais como os melhores do país, a floresta mais preservada, o maior número de áreas protegidas, mas nós queremos também que a nossa população, que os indicadores sociais e os indicadores econômicos também possam subir, nós queremos usufruir desse valor que é a nossa floresta, que são os nossos rios, que é toda essa biodiversidade que nós temos.
Nós não usufruímos, porque vivemos na pobreza ou abaixo dela. Então, o petróleo é uma possibilidade, não pode ser a única, nós temos que saber que ela será transitória. Mas é uma das possibilidades fortes de nós equilibrarmos esse jogo, de mantermos esses indicadores ambientais, mas elevarmos os indicadores sociais e econômicos.
Vamos supor que seja confirmada a exploração, a viabilidade comercial. Para onde iriam esses recursos dos royalties? O que você planeja?
Esse plano não existe, porque tudo é muito novo, mas é claro que nós estamos voltando todos os nossos esforços, toda a nossa energia, toda a massa política para que a gente faça diferente de muitos estados e municípios que surfaram na onda do petróleo e, depois, quando a curva começou a baixar de produção, os estados começaram a sentir.
Nós queremos resolver problemas imediatos da fome, da pobreza, das questões urbanas, dos 16 municípios do estado, mas queremos também fazer uma reserva para os tempos vindouros. Nós acreditamos na transição energética, por isso, nós temos que dar o exemplo. Ou seja, se nós entendemos o petróleo como uma matriz econômica e energética que está em transição para outras matrizes, vamos nos preparar para elas e aproveitar o financiamento que ele pode nos dar para financiar essa transição, não é transição energética sem petróleo e sem mineração. Então, é esse debate que a gente está fazendo aqui.
Eu estou fazendo um convite para as universidades, os institutos de pesquisa, para a gente debater, mas debater sem os mitos, sem os tabus, sem os dogmas que não fazem bem a esse debate.
Clécio Luís, governador do Amapá
Eu senti muito, nas andanças, um certo trauma no estado diante da população com os projetos que prometeram desenvolvimento e não trouxeram. Um clássico é o Serra do Navio. O que dizer para essas pessoas que veem esses projetos, que prometeram desenvolver o estado. O que dizer para quem vê a promessa do desenvolvimento?
Duas coisas a dizer. Uma: que esses projetos – eu posso falar aqui de três, Icomi, Jari, Novo Astro – são três projetos diferentes com base em mineração ou de grandes projetos. Os três são um modelo de projeto chamado enclave econômico. São projetos todos construídos fora daqui, e eles eram cravados no meio do Amapá. Então, o modelo de primeira exploração, que é fazer pesquisa e, depois, se possível, fazer exploração de petróleo, é um modelo diferente. Outra: não é que eles não trouxeram desenvolvimento. É que, durante a sua fase produtiva, não se pensou em uma outra alternativa.
Então, todo mundo sabia que a exploração, por exemplo, de manganês na Serra do Navio, era para 50 anos. Qual foi a outra atividade financiada por essa atividade econômica que foi desenvolvida no estado? Nenhuma. Se a gente produzia manganês, vamos imaginar a década de 40/50/60, em plena Guerra Fria, o manganês era um dos minérios mais estratégicos do planeta, a gente tinha a maior jazida daquela época. Ou seja, tinha muita receita privada e receita pública também. Não se pensou, por exemplo, o que fazer já que ali do lado tinha uma outra jazida de ferro para a gente produzir, que fosse bicicleta aqui, que não é algo com grande tecnologia. É isso que nós precisamos fazer de diferente.
Durante uma fase de produção de petróleo nós temos que pensar primeiro em mudar as matrizes das nossas instituições de pesquisa e de educação, a academia, para criar e formar quadros que possam trabalhar nessa área. Depois, pensar em produtos, serviços, direcionamentos políticos e econômicos que possam dar longevidade a esse período que é transitório.
Por exemplo, a gente fala muito do petróleo como queima, não é isso? Como combustível. É um combustível fóssil, queima, emissão de CO2 etc, mas, do petróleo, também deriva uma indústria poderosíssima que é a da petroquímica, que não polui.
Quase tudo que nós temos aqui, aquela câmera que está nos filmando, os celulares que estão nos filmando, a nossa roupa, esse microfone, quase tudo tem petróleo e é uma indústria que, obviamente, se nós temos uma jazida aqui perto, nós teremos condições de aproveitar ou pelo menos concorrer que essa indústria pudesse ir para o Amapá.
Clécio Luís, governador do Amapá
Então, nós temos que pensar. Se você disse “tem um projeto?”, não tem, até porque é tudo muito novo, essa decisão é de meses para cá, de realmente utilizar ao máximo, não usar tudo de uma vez, os recursos, benefícios dessa produção e pensar em projetos com maior longevidade e pensar estrategicamente na transição energética.
O senhor sente que é quase uma redenção para o estado?
Pois é, eu evito esses termos mais efusivos porque ele pode gerar uma descredibilidade de algo que a gente está com muita esperança, mas, de fato, em pelo menos curto prazo, 5, 10 anos, é algo que pode dar robustez a nossa economia, pode gerar escala em receita e nos permitir fazer umas coisas que são emergenciais mesmo e planejar um futuro com mais fôlego, um futuro que não é negociável.
Uma das coisas que eu mais tive dificuldade foi encontrar algum político contrário. De certa maneira, uniu os adversários. Por quê?
É verdade. Primeiro, nossa situação é realmente de pré-colapso sempre. Nós temos os piores indicadores educacionais, nós temos os piores IDHs, nós temos os piores indicadores em todas as áreas sociais, então, há uma convergência. Não diria que é uma unanimidade, mas há uma convergência para essa triste realidade do Amapá. Por outro lado, eu falo isso, não falo com orgulho, mas também não falo me lamentando, eu quero dizer “olha, o quadro é esse, não é bom o quadro social, o quadro econômico não é bom”. Por outro lado, nós temos um potencial gigante, o petróleo é um desses potenciais, nós temos outros, mas é um desses potenciais.
Então, se nós temos uma convergência de que a situação não é boa, e uma convergência de que algo pode nos tirar dessa condição, mesmo que seja progressivamente, eu não vejo como uma redenção “ah, a partir do petróleo”, não é assim, mas o que pode nos tirar disso progressivamente. Mas acabamos criando não uma unanimidade, mas uma unidade, um consenso em favor de que nós não podemos abrir mão dessa matriz econômica e energética.
A própria Marina, a própria ministra Marina Silva, que conhece o Amapá, ela disse ‘o Brasil ainda não tem condição de abrir mão do petróleo como matriz energética e econômica’.
Clécio Luís, governador do Amapá
Eu estou falando, então, que, se é importante para o Brasil, que é uma potência mundial, que é líder na América Latina, imagina para o Amapá, que não é líder no Brasil, que é um dos menores estados, um dos mais pobres, com certeza. Quanto isso é importante para a gente. Por isso que se gerou esse consenso em torno dessa necessidade.
Primeiro, é bom que se esclareça isso. Poxa, nos deem o direito de pesquisar, porque o que nos foi negado foi o direito à pesquisa. A fase exploratória para petróleo, gás e mineração significa pesquisa. Então, nós precisamos pesquisar. Um navio estava aqui, Caio, gastando R$ 4 mi por dia. Passou aqui meses. A cápsula que leva a sonda estava pronta para fazer primeiro uma simulação de um acidente, você sabia disso?
Eu sabia desses custos.
Foi exigido da Petrobras uma simulação de um provável acidente. Muito bom que exigiram, louvável. O que seria a simulação? A própria Petrobras e seus técnicos conseguiram inventar um produto a partir do milho, como se fosse uma pipoca, que eles conseguem fazer uma simulação de um acidente. Então, qual era a simulação? Descer a 2.880 metros no espelho d’água, soltar esse produto simulando petróleo lá embaixo como se fosse um vazamento e fazer toda a análise de como isso iria subir, em que velocidade, se mais ou menos velocidade, se ela iria subir coesa ou de forma descoordenada, que correntes iria pegar, para ter um plano mais real ainda de pronto atendimento em um eventual acidente. Acidente este que nunca ocorreu. A Petrobras já cavou mais de 3 mil poços. Por que eu estou falando isso? Porque eu precisei saber, me cercar dos cuidados.
É isso que eu queria te colocar até: você não teme nas suas reflexões o impacto ambiental?
Não temo, mas, para não temer, eu tenho que ter segurança. Então essa simulação, a Petrobras fez a perfuração de mais de mil poços em águas profundas. A Petrobras é talvez a empresa com maior know-how nesse tipo de perfuração em águas profundas, tanto que, para eles, lá é Amapá Águas Profundas o nome do projeto.
Nunca teve nenhum acidente, zero acidente, quer dizer, se nós nos cercamos de todos os cuidados, o tipo de perfuração, a gente faz uma espécie de encabeçamento, controla dentro desse ambiente, desse túnel. Eles controlam pressão, tiram ar, tiram água, para a sonda chegar lá com toda a segurança, fazer a perfuração com todo o cuidado, só depois liberam. Nunca teve nenhum acidente, eles são especialistas nisso.
Mas não é só isso, a alta tecnologia da Petrobras, os estudo hidrológicos de correntes daquela região. Nós estamos quase no limite da nossa placa continental. Se fala muito em foz do Rio Amazonas, porque essa região é conhecida como a bacia da foz do Rio Amazonas, mas esses poços estão a 540 km da foz do Rio Amazonas, a barra norte, e estão a 174 km lá da ponta do cabo Orange, onde você foi.
Então, há muita segurança nas informações técnicas que a Petrobras produziu, que o serviço geológico brasileiro também tem à disposição. São aqueles velhões, no melhor sentido da palavra, que são da geologia brasileira, que conhecem profundamente e que sonham com o que pode acontecer aqui. Está se falando, Caio, em um segundo pré-sal. Isso já é muito, não é qualquer coisa.
Agora, tu imagina que é o segundo pré-sal em um momento em que o pré-sal está quase atingindo o seu ápice. Vai começar a ter uma curva de declínio da produção. Então, volta de novo para aquela situação. Isso é fundamental para o Brasil. Se é para o Brasil, imagina para nós aqui, no extremo norte do Brasil.
O senhor quer colocar mais alguma coisa?
Eu acho que é importante, como eu estou desde dezembro discutindo isso, é natural que eu até me empolgue. Eu sou um entusiasta, primeiro da pesquisa, depois da pesquisa, tendo os resultados, aí a decisão de se produzir ou não. Ao meu ver, tem que ser tomada em um patamar estratégico, não pode ser tomada em uma mesa, em uma comissão ou num segmento, é uma decisão estratégica que tem que levar em consideração riscos ambientais, potencialidades, as equivalências de se produzir petróleo no extremo norte do Brasil.
Enfim, para tomar decisão à altura do que é ter produção de petróleo e gás na Amazônia brasileira, na Amazônia azul, porque nós estamos falando do Oceano Atlântico, e que seja uma decisão baseada em estudos e pesquisas sérias. É o que nós estamos propondo que aconteça. Eu não quero que faça de qualquer jeito, de forma alguma.
Eu, como governador, quero ter também a segurança de que produzir petróleo vai ser bom sob todos os aspectos. Eu vou repetir como eu comecei a minha fala: nós não queremos diminuir nossos indicadores ambientais, isso é um orgulho para a gente. Mas nós queremos que esses indicadores ambientais puxem os nossos indicadores sociais e econômicos, porque o povo que mora aqui, no extremo norte do Brasil, está acima da linha do Equador, tem o direito a se desenvolver também.
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